Loucas sugestões ou o que ler no feriado



Mais um feriado que você via passar em casa... é de enlouquecer, não? Não, não é! Que tal alguns livros para te fazer companhia na sua cadeira favorita, na sua cama, na varanda ou em algum lugar da sua cidade que você goste de carregar seu livrinho e ler lá.

Você, leitor da Revista RapaDura, já sabe que o tema do mês é a loucura e provavelmente já leu o artigo sobre Diário do hospício e O cemitério dos vivos, escrito por Álvaro Marins; achamos pouco e listamos algumas sugestões a mais de leitura que tratam do tema (não resisti ao trocadilho) ou que tenham em suas páginas um ou outro personagem que careça de cuidados psiquiátricos. E ainda, se você está no Rio de Janeiro, sugerimos as livrarias Moviola e Blooks para encontrar esses quitutes literários de Páscoa.




Todos os cachorros são azuis, Rodrigo de Souza Leão. Rio de Janeiro: 7Letras, 2008.

“É tão triste ter como amigo duas alucinações”, diz o paciente interno chamando por Rimbaud e Baudelaire, nomes que deu às suas duas alucinações mais frequentes. É neste tom entre cômico e triste que segue a novela de Rodrigo Souza Leão, indicada ao prêmio Portugal Telecom de 2009. Em 4 curtos capítulos, o discurso do personagem esquizofrênico não tem ordem cronológica, indo e voltando desde a situação na casa dele e a dificuldade da família em lidar com o filho doente até quando se vê fechado com outros pacientes em uma instituição mental, “um lugar cheio de flores lindas, mas podre por dentro.”. O olhar é tanto divertido, como quando menciona uma vez em que se masturbou ao ritmo da música “Dança da motinha”, quanto trágico, como quando o narrador se dá conta de que tem 37 anos e vive ainda como uma criança. É um livro bastante forte, mas nem por isso menos prazeroso. A linguagem é contagiante, cai bem aos ouvidos, por seguir a oralidade do autor, ele mesmo um paciente esquizofrênico que frequentou hospícios até o fim de sua vida, em 2009.


O alienista, Machado de Assis. Porto Alegre: L&PM Pocket, 1998.

O Doutor Simão Bacamarte, após formar-se em Coimbra e Pádua, sendo considerado o melhor médico de Portugal e Espanha, chega à vila brasileira de Itaguaí. Lá, ele casa, constitui família e ganha imenso respeito dedicando-se integralmente ao estudo da ciência e da lógica dos comportamentos. Seus estudos trazem a novidade de que ali mesmo na vila habitam alguns loucos, e não são poucos. A atmosfera antes pacata e repetitiva do lugar muda completamente quando o Dr. Bacamarte dá início ao seu ambicioso projeto, a Casa Verde, um reduto para abrigar, observar e curar os loucos. A divertida novela de Machado Assis apresenta com muito bom humor o poder do diagnóstico, da palavra e da autoridade do médico, assim como a extensão que as medidas medicinais ganham na sociedade. Essa leitura rápida e certeira nos deixa pensando sobre as fronteiras entre o louco e o são, entre o paciente e o curador.


Eu, Pierre Riviere, que degolei minha mãe, minha irmã e meu irmão, Michel Foucault. São Paulo: Graal Editora/Paz e Terra, 2007.

Em 1973, o filósofo francês Michel Foucault juntou uma equipe para estudar, pensar e produzir um dossiê sobre o caso Pierre Riviere. Em 1977 esta pesquisa se tornou um seminário no College de France e depois virou o livro acima. O chamado caso Pierre Riviere se refere ao jovem camponês que, em 1835, matou a golpes de foice a mãe grávida, a irmã adolescente e um irmão de sete anos. Pierre foi preso, e em sua cela escreveu longo depoimento sobre as razões de seu ato. Em meio à sua condenação à morte, travaram-se muitas polêmicas entre os pontos de vista dos psiquiatras e dos juristas sobre o caso. Ao fim, a condenação judiciária foi suspensa pelo diagnóstico médico: o jovem foi considerado louco e a prisão perpétua se tornou sua pena. Meses mais tarde, Pierre se enforcou em sua cela. A obra é interessante por marcar historicamente o início da importância social, inclusive nos poderes do Estado, que os estudos da mente passam a reivindicar. É marcante também o depoimento do jovem Pierre, que julga ter motivações bastante lógicas para seus atos assassinos.


A lua vem da Ásia, Campos de Carvalho. Rio de Janeiro: José Olympio, 2008.

Astrogildo – que antes já foi Adilson, Heitor, Ruy Barbo – confessa que aos 16 anos matou seu professor de lógica, em legítima defesa, dada a natureza ameaçadora da matéria que o professor ensinava, e foi morar debaixo de uma ponte do Rio Sena… apesar de nunca ter estado em Paris. Ficamos sabendo disso no primeiro parágrafo do romance de Campos de Carvalho que inaugura sua leva de obras surrealistas que marcaram a literatura brasileira. A confissão é feita enquanto Astrogildo está morando num hotel de luxo, segundo ele, mas que provavelmente é um hospício, dentro do qual ele relata seus dias num diário, contando as experiências da confinação, até o dia em que, depois de muito pensar em como fugir, vai andando calmamente em direção à porta de saída e… pronto, consegue escapar. A partir daí o leitor é levado por uma jornada incrível pelas recordações (alucinações) de Astrogildo, que passou por Varsóvia, Madagascar, Nova York, Cidade do México, atravessou desertos a pé e oceanos a braçadas, coisa na qual se esmerou quando nadou o Estreito de Gibraltar a fim de escapar de um sultão de Marrocos que muito se afeiçoou a ele. O livro, publicado originalmente em 1956, é uma ode irônica ao absurdo, à fragmentação do discurso racional, e apresenta um personagem comovente, desencantado com as relações sociais, tratando o desencanto com ironia e lirismo originais.

E não esqueçamos de personagens como Hamlet, Quincas Borba, Dom Quixote, Policarpo Quaresma, Ahab(?), e muitos outros; poderíamos ficar aqui listando livros e livros e escrevendo sinopses, seria de endoidecer, mas achamos por bem deixar você mesmo criar a sua lista ;) 


Bom feriado a todos!




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